sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Adélia Prado




 o amor quer abraçar e não pode.

a multidão em volta,
com seus olhos cediços,
põe caco de vidro no muro
para o amor desistir.

o amor usa o correio,
o correio trapaceia,
a carta não chega,
o amor fica sem saber se é ou não é.

o amor pega o cavalo,
desembarca do trem,
chega na porta cansado
de tanto caminhar a pé.

fala a palavra açucena,
pede água, bebe café,
dorme na sua presença,
chupa bala de hortelã.

tudo manhã, 
tudo truque,
engenho:

é descuidar,
o amor te pega,
te come,
te molha todo.

mas água o amor não é.
.