A questão do aborto, vista sem hipocrisia
Fim do Silêncio, de Thereza Jessouroun, foi exibido na TV Cultura
Luiz Zanin Oricchio
Fim do Silêncio é um documentário muito simples e por isso abre o jogo: o aborto ilegal é um dos principais problemas de saúde pública do País. O filme, de Thereza Jessouroun, tem seu grande mérito em tratar o tema sem o moralismo habitual. Ouve as pessoas envolvidas no problema - as mulheres que tiveram, ou optaram por praticá-lo. E, sabiamente, ignora especialistas, políticos e religiosos.
Thereza visita mulheres no Rio, em Pernambuco e São Paulo. Há entrevistadas de várias classes sociais. Muitas falam de danos à saúde, danos psicológicos, ou situações grotescas, como a que encontrou dois fetos embrulhados num pacote.
No total, são 22 mulheres, que olham para a câmera, sem esconder o rosto, o nome ou a emoção. Contam por que, em que circunstâncias, praticaram a interrupção da gravidez. Muitas vezes foi por decisão própria; outras, por imposição de maridos ou parceiros. Poucas cenas externas são mostradas. O resto é esculpido em planos internos, a câmera em geral fixa, concentrada no rosto de quem fala.
Entre os depoimentos intertítulos informativos. Por exemplo, que o medicamento Cytotec é o abortivo mais usado. Ou que o projeto de descriminalização está empacado na Câmara desde 1991. Ou que os lobbies religiosos são o principal entrave à aprovação da lei.
O filme foi financiado pelo Ministério da Saúde e não se propõe como panfleto pró-liberalização do aborto. Se toma um partido, o faz em nome de quem sofre na pele o problema. Abre uma fresta na ignorância e joga luz sobre a hipocrisia com que a questão em geral é tratada.
EU: Matéria copiada do Estado de São Paulo. Me incentivou a assistir o filme-documentário.