segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Raimundo Carrero... e seu AVC.



Existem muitas variações à frase atribuída a Joseph Goebbels, uma das figuras centrais do nazismo alemão.
"Quando ouço a palavra cultura, tenho vontade de puxar o revólver."

Toda a finalidade da cultura, na minha opinião, é refinar a visão e o sentimento do ser humano. A forma como ele pode ver e vivenciar suas experiências.

Num contraste:

1 - o site "modelmayhem" é o lugar de currículos e encontro de milhares dos grandes modelos e fotógrafos do mundo.
As imagens humanas são algumas das mais belas já vistas.
O que me assusta é a pobreza de palavras.
90% das anotações feitas nas fotos se resume a 2 expressões:
"Impactante.
Muito boa pose."
E isto é tudo!!!

2 - Em contraponto, reproduzo abaixo o texto de Raimundo Carrero, um dos maiores escritores pernambucanos da atualidade, numa fabulosa entrevista a Schneider Carpeggiani, no Jornal do Commercio de Recife.
Vejam a beleza do texto, a recontar o AVC que teve poucas semanas atrás.

"Dormi tranquilamente. Sem dor de cabeça. Sem mal estar. Sem pesadelo. Não havia precisado de uísque ou de cerveja nem de comidas gordurosas. Acordei e percebi a noite comandando o mundo. Tentei me levantar umas duas vezes. Numa delas caí por cima de minha mulher.
Ela perguntou o que eu tinha: eu disse nada.
Ela disse: Carrero, você está tendo um AVC.
A banda não tocou.
O galo não cantou.
O mundo não mudou.
Eu estava morrendo.
Compreendi então as terríveis palavras de Fernando Pessoa:
A REALIDADE NÃO PRECISA DE MIM...

Havia muita gente na entrada do hospital.
Encontrei o meu amigo Lula Arraes, que confirmou o diagnóstico de minha mulher:
"Carrero, você está tendo um AVC."
Entre e aquele povo todo a minha volta e eu perguntei:
"Meu Deus, de onde vem tanta gente a esta hora?"
E me disseram: "Não seja grosseiro.
Este pessoal veio lhe ver,
veio pedir a Deus por você.".
Mas como eles sabem?
As rádios todas estão dando.

Entrei num hospital numa maca e fiquei rodando...
Me encaminharam para a UTI e era um lugar infernal:
muito barulho, muita gente falando.
Aquelas pessoas todas pareciam espectros."

Por descrições como estas é que penso:
Quando ouço a palavra Cultura,
tenho vontade de puxar ... uma flor.
E agradecer por repartir, com tanto
significado, uma experiência tão humana.